Investimento climático no brasil: energia lidera, florestas ficam para trás

O Brasil testemunhou um aumento notável no investimento climático nos últimos anos, com um salto de 157% desde 2019. Em 2023, os recursos destinados a enfrentar a crise climática atingiram a marca de US$ 67,8 bilhões (equivalente a R$ 360 bilhões). Apesar do crescimento expressivo, um estudo revela que a distribuição desses recursos permanece desequilibrada, concentrando-se principalmente em setores que não são os maiores responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa no país.

A maior parte dos investimentos tem sido direcionada para a geração de energia elétrica, um setor que representa uma parcela relativamente pequena das emissões brasileiras. Entre 2022 e 2023, 44% do financiamento climático foi alocado a projetos de energia, impulsionados pela expansão das usinas solares antes do fim dos subsídios em julho de 2023. Os investimentos em energia solar saltaram de US$ 9,5 bilhões para US$ 22,4 bilhões nesse período.
Enquanto isso, setores cruciais para a redução das emissões, como florestas e uso do solo, continuam a receber recursos insuficientes. O estudo aponta que a alocação de recursos não está alinhada com o perfil das emissões nacionais, onde o desmatamento e a agropecuária têm um peso significativo.
Crédito rural e florestas: gargalos na alocação
O financiamento para a agricultura e o uso da terra dobrou, mas grande parte desse montante está vinculada ao crédito rural “alinhado ao clima”, cujos resultados nem sempre são comprovados. Um levantamento indica que, após quatro anos, três quartos das áreas beneficiadas por empréstimos para recuperação de pastagens não apresentavam mudanças efetivas.
A situação é ainda mais preocupante no financiamento para florestas. Entre 2019 e 2023, os recursos destinados à área despencaram de US$ 1,5 bilhão para apenas US$ 254 milhões. Esse cenário contrasta com o fato de que o desmatamento e a agropecuária são responsáveis por mais de dois terços das emissões brasileiras.
Iniciativas e desafios
O BNDES tem buscado reverter essa situação e anunciou a mobilização de R$ 7 bilhões para iniciativas de restauração e proteção florestal. No entanto, dados do próprio banco mostram que a maior parte dos recursos aprovados pelo Fundo Clima ainda é destinada à transição energética, com usinas solares representando uma parcela significativa das operações contratadas. Especialistas apontam que o setor de energia solar já apresenta um excesso de oferta no sistema elétrico brasileiro.
A concentração de investimentos não é um problema exclusivo do Brasil. Em nível global, quase metade do US$ 1,8 trilhão gasto em 2023 também foi direcionada ao setor de energia. No Brasil, o setor de transportes recebe um financiamento climático limitado, com apenas 10% das aprovações do Fundo Clima, apesar da crescente eletrificação da frota em outros países.
Adaptação negligenciada
Além da má distribuição entre setores emissores, o Brasil enfrenta dificuldades na alocação de recursos para adaptação, ou seja, medidas que preparam a sociedade para eventos climáticos extremos. Apenas 7% dos recursos entre 2022 e 2023 foram destinados a esse tipo de iniciativa. Em 2025, os projetos de adaptação representam apenas 10% do valor aprovado para mitigação pelo BNDES.
O cenário global também reflete essa negligência. Apenas 2% do financiamento climático internacional é aplicado em adaptação. Essa situação afeta principalmente as populações mais vulneráveis, que sofrem mais com enchentes e outros desastres climáticos. A prioridade deveria ser o saneamento, moradia de qualidade e infraestrutura básica.
O contraste entre o crescente volume de recursos e a baixa capacidade de impactar os setores que mais emitem continua sendo um dos principais desafios para o Brasil.
Fonte: www.tempo.com

