Como mensurações tropicais impulsionam o crédito agrícola?
Belém (PA) – A necessidade de ampliar o acesso ao crédito, especialmente para pequenos produtores, emergiu como um ponto crucial nas discussões sobre agricultura na COP30. Um elo entre essa demanda e a disseminação de métricas de emissões de gases de efeito estufa adaptadas ao modelo tropical pode ser a chave para destravar mais financiamento para o agronegócio, principalmente por parte de investidores privados.
Representantes do Itaú BBA e do Rabobank acreditam que a adoção de métricas melhores e mais regionalizadas impulsiona a oferta de crédito. “Acho que dá para estabelecer essa relação direta”, afirmou João Adrien, ESG Agri Head do Itaú BBA, durante um painel na COP30. Segundo ele, práticas regenerativas limitam riscos, e mensurações mais precisas das condições gerais de financiamento (MRV) permitem entender os benefícios e desenvolver soluções financeiras personalizadas para cada perfil de produtor.
Taciano Custódio, diretor de Sustentabilidade no Rabobank Brasil, concorda. Ele ressalta que as métricas de emissões mais populares foram elaboradas com base na agricultura temperada. A COP30 representa uma oportunidade de expandir o financiamento com métricas que incorporem os atributos tropicais, em desenvolvimento por instituições como a Embrapa. Essas métricas tropicalizadas refletirão com mais precisão as emissões do setor e as capturas de carbono.
Ainda segundo Custódio, o Brasil tem se posicionado nesse diálogo, mas a construção de uma agenda científica qualificada, acessível ao pequeno produtor rural, depende dessas métricas. O resultado esperado é taxas de juros mais competitivas, atreladas a critérios e indicadores de performance, com prazos e carências ampliados.
Eduardo Bastos, CEO do Instituto Equilíbrio, presente no painel, destacou que métricas regionalizadas são essenciais para viabilizar iniciativas públicas, como o programa Caminho Verde Brasil do Ministério da Agricultura e Pecuária. O programa visa restaurar 40 milhões de hectares de áreas degradadas em dez anos, oferecendo crédito a juros mais baixos para produção regenerativa e sem desmatamento. Bastos ressaltou a discrepância entre a importância da agricultura e o financiamento que recebe, mencionando que o setor emprega 40% da população e gera 10% do PIB global, mas recebe apenas 3% a 4% do financiamento.
A tropicalização das métricas é fundamental, considerando práticas como a fixação biológica de nitrogênio, técnica da Embrapa que fortalece raízes e transforma óxido nitroso em nitrogênio para as plantas. A padronização das métricas, como a profundidade das trincheiras para medir a captura de carbono, precisa considerar as características tropicais para evitar desvantagens para os produtores brasileiros.
A produtora Aline Vick, da Fazenda Estância, em Pirassununga (SP), destacou o papel da agricultura regenerativa na mitigação do risco da atividade rural, atuando como um “stop loss” na lavoura. Práticas regenerativas ajudam a reter umidade no solo, minimizando perdas financeiras decorrentes de eventos climáticos extremos.
Além de reduzir riscos, a sustentabilidade atrai grandes compradores, conforme Vick. Sua fazenda tem emissões 60% menores na soja e 40% menores no milho, o que torna seus grãos mais atrativos para empresas com metas de compensação de carbono.
Pedro Fernandes, diretor de agro do Itaú BBA, mencionou o Programa Reverte, em parceria com a Syngenta, que busca alcançar um milhão de hectares regenerados até 2030. Inicialmente com uma meta de 100 mil hectares, o programa já alcançou quase 290 mil, com R$ 2 bilhões liberados. André Savino, presidente da Syngenta, enfatizou a importância da saúde do solo, educação e financiamento para o sucesso do programa.



