Diferença salarial persiste: barreiras culturais e sociais travam igualdade no trabalho
A desigualdade salarial entre homens e mulheres continua sendo um desafio marcante no cenário socioeconômico brasileiro. Apesar de avanços legislativos e políticas de inclusão, os dados revelam disparidades significativas, enraizadas em barreiras culturais e estruturais históricas.
Mulheres, especialmente as negras, enfrentam desvantagens salariais em diversos setores do mercado de trabalho. Essa realidade evidencia a necessidade urgente de converter leis em práticas efetivas dentro das empresas e instituições públicas.
Um relatório recente apontou que trabalhadoras brasileiras recebem, em média, 21,2% a menos que homens, representando uma diferença de R$ 1.049,67 em empresas com mais de 100 funcionários. A análise de milhões de vínculos formais demonstrou que, enquanto homens ganham em torno de R$ 4.958,43, mulheres recebem R$ 3.908,76. Embora tenha havido um leve aumento na participação feminina, a desigualdade permanece expressiva.
Especialistas estimam que, se a massa salarial feminina correspondesse à sua representatividade no mercado, a economia nacional poderia receber um impulso de R$ 92,7 bilhões, fortalecendo o consumo e a arrecadação.
A questão salarial transcende o âmbito jurídico. Para especialistas, a lei existente só se converterá em cultura quando os setores jurídico, de compliance e de recursos humanos colaborarem para transformar a equidade em um valor intrínseco, e não apenas uma obrigação. Embora o Brasil possua uma estrutura legal robusta para assegurar igualdade de remuneração, obstáculos culturais ainda associam liderança e mérito à figura masculina. A equidade de gênero precisa ser integrada à cultura corporativa, ultrapassando as exigências legais.
Empresas frequentemente justificam disparidades salariais com base em experiência, metas de produtividade e planos de cargos e salários. Entretanto, a análise desses dados em relação a gênero e raça revela desigualdades acentuadas. Mulheres negras, por exemplo, recebem 53,3% a menos que homens não negros, demonstrando que a desigualdade está intrinsecamente ligada à questão racial, representando um problema estrutural persistente.
Estados como Paraná e Rio de Janeiro apresentam as maiores discrepâncias salariais, enquanto Piauí e Amapá registram as menores. A aplicação da Lei de Igualdade Salarial ainda enfrenta resistência em diversas empresas, principalmente naquelas que não possuem políticas internas de inclusão.
A desigualdade salarial não é apenas uma questão de justiça social, mas também um entrave ao crescimento econômico. Economistas apontam que essa disparidade limita a expansão da renda nacional e reduz o potencial de consumo de famílias lideradas por mulheres.
Um relatório do Fórum Econômico Mundial estima que o Brasil levará mais de um século para alcançar a igualdade no mercado de trabalho, mantendo o ritmo atual. Este cenário, além de injusto, representa uma perda de competitividade para o país em âmbito global.
Empresas com maior equidade de gênero tendem a apresentar melhorias em produtividade, inovação e reputação, o que resulta em vantagens competitivas.
Apesar do cenário desafiador, observam-se avanços lentos, porém consistentes. O número de empresas com diferença salarial inferior a 5% entre homens e mulheres aumentou nos últimos anos. Além disso, o percentual de empresas com pelo menos 10% de mulheres negras também apresentou crescimento.
O governo tem intensificado a fiscalização, realizando inspeções e emitindo autos de infração. O foco agora é consolidar a aplicação da lei e combater práticas que distorcem vínculos formais e mascaram as disparidades salariais.
Organizações privadas também desempenham um papel fundamental na redução das desigualdades. Empresas que integram a equidade à sua governança não apenas fortalecem sua imagem institucional, mas também seu valor de mercado. A equidade deixou de ser apenas uma pauta social para se tornar um ativo estratégico.
A luta pela equidade salarial também envolve educação e mudança cultural, superando estereótipos arraigados que associam determinadas profissões ou cargos de liderança a perfis masculinos. Transparência salarial, publicação de relatórios oficiais e ferramentas digitais são importantes para enfrentar a desigualdade.
O Brasil possui a base legal e institucional necessária para combater a desigualdade de forma mais efetiva. O desafio reside na implementação prática dessas políticas e na mudança de mentalidade dentro das organizações. A equidade deve ser tratada como um indicador estratégico, mensurado e acompanhado com a mesma importância das metas financeiras. A colaboração entre governo, empresas e sociedade civil é indispensável para acelerar as transformações.

