Família bolsonaro em crise expõe racha na direita brasileira
A recente disputa pública entre os filhos de Jair Bolsonaro, Eduardo, Flávio e Carlos, com a ex-primeira-dama Michelle, reverberou intensamente no cenário político, evidenciando a dependência da direita brasileira em relação às decisões da família Bolsonaro para definir estratégias para as eleições presidenciais de 2026. A iminente perda de capital político, somada à crescente pressão para que o Centrão indique seu candidato preferido, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, culminou na exposição de articulações antes restritas aos bastidores, revelando a errática movimentação dos familiares do ex-presidente.
O embate se intensificou após a participação de Michelle no lançamento da candidatura de Eduardo Girão ao governo do Ceará, onde ela criticou André Fernandes pela articulação de uma aliança do PL em torno de Ciro Gomes. Michelle questionou a aliança com alguém que se opõe ao “maior líder da direita”, referindo-se aos insultos proferidos por Ciro contra Bolsonaro, incluindo acusações de corrupção e comparação com “ladrão de galinha”.
Ciro Gomes, em diversas ocasiões, teceu críticas severas a Jair Bolsonaro, acusando-o de “roubar dinheiro de joia” e mencionando rachadinhas, compra de imóveis em espécie e corrupção generalizada. Ele também estendeu as acusações aos filhos e ex-esposas de Bolsonaro, qualificando-os como “ladrões”. Em outro momento, Ciro afirmou que o ex-presidente “corrompeu todas as suas esposas” e que seu governo só perdia em corrupção para o de Lula, insinuando um empate.
A crítica de Michelle levanta diversas questões. Em primeiro lugar, ela expressou apoio à vereadora Priscila Costa para o Senado, enquanto a negociação em curso indicava que uma vaga seria destinada a Tasso Jereissati e a outra ao pai de André Fernandes, Alcides Fernandes. Além disso, a ex-primeira-dama assumiu a postura de defensora da honra do marido, em meio a um processo de “martirização” de Bolsonaro por seus aliados. Ao rejeitar uma composição com alguém que não se alinha aos “valores” do bolsonarismo, Michelle atraiu para si o núcleo duro desse eleitorado.
Michelle, como presidente do PL Mulher, tem viajado pelo país e participado de eventos públicos. Após a proibição de Bolsonaro deixar Brasília, ela intensificou suas viagens e postagens nas redes sociais em nome do casal, consolidando redes de mulheres conservadoras e atraindo o apoio de segmentos evangélicos.
Uma pesquisa recente indica que Michelle possui o mesmo percentual de votos em um segundo turno que o marido e Tarcísio de Freitas, empatando com Lula. Tal potencial de voto, somado à sua retórica que agrada o núcleo duro bolsonarista e atrai eleitorado feminino, a coloca em posição de destaque.
Diante do crescente protagonismo de Michelle, os filhos de Bolsonaro reagiram nas redes sociais e na mídia. Flávio Bolsonaro classificou a atitude de Michelle como “autoritária e constrangedora”, afirmando que ela “atropelou o próprio presidente”. Carlos Bolsonaro defendeu o respeito à liderança do pai, enquanto Eduardo Bolsonaro considerou a atitude injusta e desrespeitosa com André Fernandes.
No entanto, Flávio Bolsonaro se desculpou com Michelle e se comprometeu a estabelecer uma rotina de decisões conjuntas no PL. Michelle, por sua vez, defendeu seu direito de expressar seus pensamentos com liberdade e sinceridade, reafirmando seus valores como mulher, mãe e esposa.
Embora Eduardo Bolsonaro ainda critique Tarcísio de Freitas, a articulação que envolve Flávio já considera a possibilidade de não haver um Bolsonaro na disputa presidencial, visando o apoio da “marca” pelo preço mais alto possível. A ocupação do cargo de vice na chapa de Tarcísio seria uma forma de garantir a lealdade do governador ao ex-presidente.
Michelle busca se colocar como uma possível vice, agregando valor à candidatura de Tarcísio, mas a possibilidade de ceder a candidatura a vice para alguém que usaria o sobrenome da família pode ser demais para os filhos de Bolsonaro. Jair Bolsonaro, conhecido por sua postura misógina, pode não endossar a candidatura de uma mulher, mesmo como vice.
Enquanto isso, o Centrão, por meio de Gilberto Kassab, expressou a necessidade de Tarcísio se apresentar como um líder acima do bolsonarismo, buscando um eleitorado de centro-direita. A candidatura de um integrante da família Bolsonaro poderia bloquear Tarcísio e forçar o PSD a lançar um candidato próprio, fragmentando o campo da direita. Diante desse cenário, o Centrão não pretende ver o jogo parado.

