Furacão melissa devasta o caribe e expõe crise climática
O furacão Melissa, com ventos que já atingiram 298 km/h, chegou à costa da Jamaica na tarde de terça-feira, trazendo a ameaça de devastação sem precedentes. Especialistas alertam para um impacto catastrófico no país, que nunca foi atingido por uma tempestade de categoria 5, o nível máximo na escala que classifica furacões.
O furacão tocou o solo próximo a New Hope, por volta das 13h (horário do leste dos EUA). Apesar dos alertas emitidos, a dimensão da tempestade torna a preparação uma tarefa quase impossível. O furacão Gilbert, em 1988, foi a tempestade mais forte a atingir a ilha em 150 anos de registros, alcançando categoria 3 e causando 45 mortes.
Após a Jamaica, Melissa deve atingir Cuba, embora enfraquecido para a categoria 3, durante a noite de terça-feira. Esperam-se chuvas torrenciais, ventos fortes e marés elevadas na metade leste da ilha. As Bahamas e Bermudas também estão em potencial rota da tempestade, embora com menor intensidade.
A previsão aponta que Melissa despejará cerca de 1.020 mm de chuva na Jamaica nas próximas horas, o equivalente a sete ou oito meses da precipitação média acumulada da cidade de São Paulo, ou três meses do período chuvoso no país caribenho.
Anne-Claire Fontan, especialista em ciclones tropicais da Organização Meteorológica Mundial, adverte para o risco de “falha estrutural total”, com inundações repentinas catastróficas e numerosos deslizamentos de terra. Além da chuva e do vento, ondas de três a quatro metros são esperadas na costa sul da Jamaica.
Necephor Mghendi, chefe da delegação da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, prevê danos extensos à infraestrutura, isolando comunidades e interrompendo serviços essenciais por dias ou semanas. Famílias jamaicanas ainda se recuperam do furacão Beryl, que causou destruição com ventos de 251 km/h em julho de 2024, deixando quatro mortos e centenas de milhares de casas sem luz.
“O furacão Melissa agora ameaça as mesmas comunidades, e talvez todas as atividades sejam destruídas”, alerta Mghendi. “Este é um exemplo de como eventos climáticos extremos podem realmente causar choques nas comunidades e sobrecarregar sua capacidade de resistência.”
Desde 1851, Melissa é apenas a 45ª tempestade a atingir a categoria 5, com ventos sustentados de 252 km/h ou mais. Apenas em 2005 houve três furacões de categoria 5 registrados. Em 2025, Erin e Humberto também alcançaram essa categoria, mas Melissa é o primeiro a representar uma ameaça significativa aos países da região.
Cientistas relacionam o aumento na ocorrência de tempestades devastadoras às mudanças climáticas. Melissa intensificou-se rapidamente, passando da categoria 4 para a 5 em 24 horas, com um aumento de cerca de 112 km/h na velocidade dos ventos. A tempestade passou sobre águas oceânicas que estavam 1,4°C mais quentes que a média, condições que se tornaram até 700 vezes mais prováveis devido às mudanças climáticas causadas pelo homem, de acordo com o Climate Central.
Akshay Deoras, meteorologista da Universidade de Reading, no Reino Unido, aponta que a temperatura da água do Atlântico está cerca de 30 graus Celsius, 2 a 3 graus acima do normal, fornecendo uma vasta reserva de energia para a tempestade.
O Climate Central utiliza o Índice de Mudanças Climáticas: Ciclones Tropicais (CSI) para quantificar o impacto das mudanças climáticas causadas pelo homem na intensidade de uma tempestade. As taxas de precipitação dos ciclones tropicais estão aumentando em mais de 1% ao ano, ampliando o risco de inundações, já que as tempestades de níveis elevados retêm mais umidade e mantêm sua força por mais tempo.
Daniel Gilford, meteorologista e cientista climático do Climate Central, ressalta que o aquecimento climático causado pelo homem está agravando todos os perigos de Melissa: gerando chuvas mais intensas, ventos mais danosos e maiores ondas de tempestade ao longo da costa.
Desde 1970, os oceanos absorveram cerca de 93% do excesso de calor gerado pelas emissões de carbono. Cada décimo de grau de aquecimento do oceano aumenta os riscos de tempestades mais fortes e níveis mais altos do mar.
Érika Spanger, diretora de Análise Climática Estratégica no programa Clima e Energia da Union of Concerned Scientists, destaca que uma atmosfera mais quente também é capaz de reter mais umidade, resultando em chuvas mais intensas nos sistemas tropicais.
“Em uma injustiça suprema, as pessoas e os lugares no caminho desta tempestade estão entre aqueles que menos contribuíram para a crise climática e, ainda assim, estão na linha de frente de suas consequências mortais e custosas”, observa Spanger. Ela conclui afirmando que é necessário muito mais para proteger as nações caribenhas no futuro e que há quem seja responsável por desastres como este: os decisores políticos e as empresas de combustíveis fósseis que há muito obstruem as ações climáticas, mentem sobre a ciência e deixam as comunidades enfrentar a destruição causada por eventos extremos.



