Gigantes da tecnologia moldam futuro do trabalho e identidades

Compartilhe

Gigantes da tecnologia, potências políticas e econômicas estão cada vez mais entrelaçadas, redefinindo o cenário do capitalismo global. Os líderes dessas empresas, detentores de riquezas que superam o PIB de muitos países, exercem influência direta e indireta sobre governos e populações ao redor do mundo.

Os instrumentos que esses conglomerados controlam permeiam a vida de grande parte da população mundial, impactando desde as relações cotidianas até os aspectos mais íntimos da subjetividade individual. A era digital transformou-se em algo além do neoliberalismo, impulsionando uma mutação antropológica que redefine a essência do ser humano.

O capitalismo de plataformas está moldando o indivíduo de maneiras inimagináveis há duas décadas. A conectividade constante com máquinas produtoras de informação cria um novo ente, onde a subjetividade e a identidade dependem da ligação entre homem e máquina. Essa simbiose altera as funções relacionais primárias, a produção da linguagem, a abordagem ao conhecimento, a gestão da afetividade e a criação artística.

A predominância do digital impôs uma velocidade implacável ao tempo das relações, colapsando tudo em um eterno presente. Identidades, relações e as esferas online e offline dos sujeitos são normatizadas por uma “maquinaria de ordinalização”, resultando em um planejamento minucioso da vida individual sem precedentes.

Publicidade

Nesse contexto, surge a questão central: como identificar as brechas e os pontos fracos que permitam levar a luta para o interior da “caixa preta” do sistema? A chave reside em uma pesquisa ativista focada na constituição de novas subjetividades, compreendendo como nos construímos no cenário da plataformização social, entre “técnicas de domínio” e “técnicas do si”.

Essa pesquisa deve se basear na co-pesquisa, produzindo conhecimento não sobre, mas com e para os participantes, transformando-os em co-pesquisadores. O conhecimento produzido se torna ferramenta de luta cotidiana, desafiando o capital no seu próprio terreno e antecipando seus movimentos.

Essa análise minuciosa implica abandonar os nomes e conceitos tradicionais, desprendendo-se de uma época em que representavam significantes úteis e abrangentes. É preciso criar novos nomes que facilitem a compreensão dos processos de constituição das subjetividades na era digital, para reconstruir microestratégias que permitam reconquistar espaços de atuação.

Publicidade

Será que termos como “emprego precário” ou “futuro” ainda capturam as nuances da produção de subjetividades, especialmente entre os mais jovens? Qual o espaço para conceitos como solidariedade e comunidade em um contexto dominado pelo individualismo e pelas relações virtuais?

Captar como os sujeitos valorizam as formas de valorização é crucial para retomar a força de reivindicação e a produção de espaços de vida subtraídos à “maquinaria de ordinalização” do capital. A metrópole emerge como o contexto de referência prioritário, revelando as contradições inerentes à ordem global de valorização.

A relação entre digitalização e multiplicação do trabalho se torna evidente, com a divisão e a multiplicação do trabalho coexistindo como faces da mesma moeda. A digitalização e a plataformização da economia intensificam essa dinâmica, multiplicando as funções e os dispositivos que normatizam os processos produtivos e criando diferentes “cidadanias laborais” em escala global.

O trabalho se multiplica à medida que a vida inteira se torna tempo e espaço de produção. O sujeito plataformizado se transforma em um produtor total, constantemente conectado e engajado em técnicas de divisão e multiplicação que reproduzem um ciclo infinito de gostos, atitudes e preferências.

Publicidade

Dois exemplos concretos ilustram essa realidade. Bhavin, motorista de aplicativo, personifica a exploração e a autoexploração, trabalhando incansavelmente para maximizar seus rendimentos. Ângelo, trabalhador de BPO, limpa o “aquário” da internet, moderando conteúdo e avaliando dados. Ambos os casos revelam a precarização, a migração e a multiplicação do trabalho na era digital.

Em conclusão, a luta deve ser levada para a rede, complementando as lutas que ocorrem em espaços físicos. É preciso atacar o poder onde ele é mais forte, com a participação ativa de co-pesquisadores. A questão central reside em como intervir no sistema do conectivismo, subtraindo quotas de cooperação social para produzir outras conexões entre os sujeitos da cadeia de valorização das plataformas.

É preciso conectar a cooperação social do digital com a do analógico, produzindo saberes que não sejam facilmente dominados pela maquinaria da ordinalização e que se articulem como força antagônica ao longo da cadeia de valorização. A experiência de tornar a internet mais democrática, pública e livre é essencial para começarmos a respirar novamente, pois, hoje, “respirar é tão difícil como conspirar”.

Compartilhe