Por trás das entregas: O impacto do trabalho nas ruas na saúde dos entregadores
A rotina intensa dos entregadores de app nas ruas traz riscos à saúde física e mental, exigindo mais atenção às condições de trabalho e bem-estar desses profissionais.

Os entregadores de aplicativos se tornaram parte essencial do cotidiano urbano, levando comida e produtos de um ponto a outro em tempo recorde. No entanto, por trás da agilidade e conveniência que esse serviço oferece, existe uma realidade marcada por longas jornadas, pressão constante e desgaste físico e mental. As ruas, que são o ambiente de trabalho desses profissionais, escondem desafios que vão muito além do trânsito caótico.
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), cerca de 589 mil entregadores atuavam no Brasil em 2024. A grande maioria é composta por homens (98%), negros (68%) e pessoas com ensino médio completo (63%). Esses números refletem não apenas o tamanho da categoria, mas também a vulnerabilidade social de quem depende dessa profissão para sobreviver.
O trabalho nas ruas exige um estado constante de alerta. A pressão para cumprir prazos, o risco de acidentes e o trânsito intenso criam um ambiente de estresse permanente. Segundo o psiquiatra André Botelho, do Hospital Sírio-Libanês, a exposição prolongada a esse tipo de rotina eleva os níveis de ansiedade, irritabilidade e prejudica o sono, tornando o descanso pouco restaurador. Ele destaca ainda que a falta de vínculo formal e o isolamento social agravam o desgaste emocional: “Sem apoio institucional, o medo de adoecer e ficar sem renda aumenta, gerando sensação de desamparo e insegurança”, afirma o especialista.
Além dos impactos mentais, o esforço físico também cobra seu preço. Passar horas pilotando motos ou pedalando bicicletas, carregando mochilas pesadas, gera sobrecarga muscular e problemas posturais. O fisioterapeuta Bruno Alexandre Torres, de Brasília, explica que a ausência de pausas impede a recuperação do corpo: “Assim como atletas precisam de descanso entre treinos, esses trabalhadores precisam de intervalos para evitar lesões crônicas e fadiga”.
Outro ponto preocupante está na alimentação. A falta de tempo e o baixo rendimento levam muitos entregadores a recorrerem a refeições rápidas e ultraprocessadas. A nutricionista Isabela Clerot alerta que esse hábito aumenta o risco de doenças como diabetes e problemas cardiovasculares. “Eles acabam comendo o que está mais à mão, como fast food e lanches, o que, com o tempo, se torna um padrão alimentar prejudicial”, explica.
Enquanto o número de entregadores cresce — um aumento de 18% entre 2022 e 2024, segundo o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) —, o debate sobre condições de trabalho, saúde física e mental e segurança se torna cada vez mais urgente. A rotina nas ruas, muitas vezes invisível para quem recebe o pedido em casa, revela uma categoria que precisa ser vista não apenas como prestadora de serviço, mas como parte essencial da engrenagem urbana que sustenta o dia a dia das cidades.