Primeira negra imortal: ana maria gonçalves assume cadeira na abl

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A relevância da obra de Ana Maria Gonçalves, com sua exploração de temas históricos e raciais, ressoou fortemente durante sua posse na Academia Brasileira de Letras (ABL) nesta sexta-feira (7). A escritora fez história ao se tornar a primeira mulher negra eleita para a prestigiosa instituição, ocupando a cadeira de número 33, anteriormente pertencente ao gramático Evanildo Bechara.

Ana Maria Gonçalves é amplamente reconhecida por seu livro “Um Defeito de Cor”. A obra épica, com suas 952 páginas, acompanha a jornada de Kehinde, uma mulher africana que, no século 19, se dedica incansavelmente à busca por seu filho perdido. Além de sua atuação como romancista, Ana Maria Gonçalves também se destaca como roteirista, dramaturga e professora. Em seu discurso de posse, a nova acadêmica ressaltou o significado de sua chegada para a necessária renovação da ABL.

“Cá estou eu hoje, 128 anos depois de sua fundação, como a primeira escritora negra eleita para a Academia Brasileira de Letras, falando pretoguês e escrevendo a partir de noções de oralitura e escrevivência”, declarou Ana Maria Gonçalves. “E assumo para mim como uma das missões promover a diversidade nessa casa e fazer avançar as coisas nas quais nela eu sempre critiquei, como a falta de diversidade na composição de seus membros, uma abertura maior para o público e o maior empenho na divulgação e na promoção da literatura brasileira.”

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Lilia Schwarcz, historiadora e antropóloga, proferiu o discurso de abertura da cerimônia, enfatizando a importância da posse e da obra de Ana Maria em face da persistente violência contra a população negra. “Nunca o livro de Ana foi tão atual como nos dias de hoje, com as chacinas nos complexos do Alemão e da Penha”, afirmou Schwarcz. “Kehinde é uma mãe que viu um filho morrer e outro desaparecer. Simbolicamente, ela é mais uma das muitas mães brasileiras enlutadas que seguem lutando.”

A escritora Conceição Evaristo também ressaltou a centralidade da luta racial, particularmente no campo da literatura. “Eu acho que, mais uma vez, a história brasileira vem manchada de sangue, né? E o que que a literatura pode fazer nisso? Quer dizer, olhando na primeira mão, na hora do desespero, a literatura não pode fazer nada. Depois quando você pensa, eu acho que a literatura é o lugar mesmo de você tentar resolver essa realidade, né? Imaginar uma outra realidade, imaginar um outro destino para o Brasil”.

Eliana Alves Cruz, também escritora, compartilhou sua visão sobre a relevância do momento e a potencial aproximação da academia com a sociedade. “É um momento mágico, né? É um momento esperado, aguardado. Um tanto atrasado, eu acho, porque muita gente esperou para ter alguém aqui. Eu espero que seja o começo de uma renovação para a ABL, de uma aproximação com o povo.”

O evento de posse foi prestigiado por uma ampla gama de escritores, artistas e representantes da cultura negra brasileira, celebrando um marco histórico para a Academia Brasileira de Letras e para a literatura nacional.

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