Tudo era trauma: a juventude de tupac shakur em baltimore

A trajetória de Tupac Shakur, interrompida tragicamente aos 25 anos, continua a fascinar e a inspirar novas explorações. Uma nova biografia, com lançamento previsto para 2025, promete um mergulho profundo na vida breve e intensa do rapper, desde a infância em Nova York, Baltimore e na Bay Area, até os primeiros contatos com a fama e os conflitos com a lei.

Um dos capítulos do livro foca-se no período entre os 13 e 15 anos de Tupac, quando ele se mudou com a mãe, Afeni, e a irmã, Set, para Baltimore, em busca de um recomeço. A chegada a uma nova cidade revelou um adolescente vulnerável, dividido entre a independência feroz e a busca por aceitação. Foi nessa fase que a voz criativa de Tupac começou a emergir, com seus primeiros poemas e apresentações como rapper.

Quase quatro décadas após a mudança dos Shakur para uma casa geminada na Greenmount Avenue, em Baltimore, o tempo parece ter parado. A pequena área verde em frente à residência está descuidada, coberta por cacos de vidro e lixo. A escada de cimento permanece rachada, e o ar carrega o cheiro de ferrugem.

Com recursos financeiros limitados e sem um plano definido, Afeni e seus filhos se instalaram na casa, que era ocupada por uma prima e seu filho, os quais se mudaram pouco depois. A nova moradia era precária, com pintura descascando, pisos irregulares, sinais de infestação de roedores e paredes finas que não protegiam do frio. Sem telefone ou aquecimento, os canos congelavam no inverno. Após a partida dos parentes, Tupac dormia num colchão no chão de um pequeno quarto, enquanto Afeni e Set se acomodavam na sala de jantar.

Segundo Set Shakur, a casa era repugnante e a mudança foi traumática. Ela recorda os ratos, grandes como torradeiras, que invadiam a cozinha pelos buracos no chão e consumiam sua comida. Tupac tentou personalizar o seu quarto, decorando as paredes com imagens de ídolos como Bruce Lee e LL Cool J e enchendo o espaço com copos de sementes de girassol. Apesar das condições precárias, aquele quarto representava um refúgio para o jovem que nunca tivera um espaço só seu.

Enquanto Afeni procurava emprego, Tupac ingressou na Roland Park Middle School, como aluno da oitava série, três meses após o início das aulas. A escola, conhecida por sua diversidade, reunia estudantes de diferentes bairros e origens. No entanto, a diversidade era limitada, com as turmas preenchidas majoritariamente por estudantes negros. Tupac chamou a atenção pelo nome incomum e pela aparência desleixada. Colegas o descreviam como magro, com pés tortos, roupas desgastadas e dentes em mau estado.

Apesar de ser alvo de olhares e risos, Tupac dedicava-se à escrita, sempre com um bloco de notas e uma caneta azul. Ele dizia que estava criando uma peça para sua futura carreira de ator. Um dia, durante uma aula de matemática, Tupac defendeu uma colega de classe, Michelle Carter, de insultos proferidos por outro aluno. Ele confrontou o agressor e o derrubou com um soco, surpreendendo a todos.

Apesar dos momentos difíceis, Tupac encontrou na Roland Park Middle School um amigo que mudaria sua vida. Dana “Mouse” Smith também era um aluno criativo, sempre escrevendo. Fora da escola, Tupac passava horas ouvindo e estudando rap. Com a mudança para Baltimore, adotou o nome artístico de Casanova Kid, uma ironia, pois ele se via como o oposto de um conquistador.

Na Roland Park, a professora de inglês Thomasina Porter pediu aos alunos que escrevessem um poema. Tupac apresentou o seu em forma de rap, surpreendendo a todos. Mouse, que também era beatboxer, aproximou-se de Tupac, e os dois começaram a passar tempo juntos. Sem recursos financeiros para alugar um estúdio, eles improvisavam gravações em um parque próximo, conhecido pelo cheiro de urina, mas com ótima acústica.

Diferente dos outros alunos, Mouse não julgava Tupac, conhecia sua situação financeira e familiar. A mãe de Tupac lutava contra o vício em drogas, e a família vivia em condições precárias. Para Tupac, a música era uma fuga da dura realidade.

Juntos, Tupac, Mouse e um amigo chamado Kevin McLeary formaram o East-Side Crew, com o qual fizeram sua estreia musical em um evento no Cherry Hill Recreation Center. A apresentação foi bem recebida, e o grupo chamou a atenção de um empresário da Jive Records, que demonstrou interesse em gerenciá-los. No entanto, Afeni insistiu que o filho se concentrasse nos estudos, frustrando o sonho de Tupac.

Em setembro de 1985, Tupac ingressou na Paul Laurence Dunbar High, uma escola de reputação estelar. No primeiro dia de aula, ele chamou a atenção de uma colega, Devena Allen, que o questionou sobre seus pés tortos e seu nome incomum. Tupac explicou que sua mãe fora uma Pantera Negra e que seu nome significava guerreiro forte e poderoso.

Nas semanas seguintes, Tupac fez questão de divulgar seu desinteresse pela escola e inventou uma história sobre a violência em Nova York ter forçado sua família a se mudar para Baltimore. Ele se apresentava como MC New York e afirmava que se tornaria famoso.

Em outubro, Tupac participou de um concurso de rap com tema de biblioteca, promovido pela Enoch Pratt Free Library, mas ficou em segundo lugar. Apesar da decepção, ele continuou a perseguir seu sonho. Para Tupac, o rap era uma forma de expressão, uma maneira de transformar sua realidade em poesia.

No final das contas, ele passou a ser influenciado por um amigo, Gault, a começar a vender drogas, o que não deu muito certo. Ele acabou conseguindo um trabalho extra como varredor, com o qual teve melhores resultados financeiros do que com o tráfico.